segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Um conto imoral




Tudo deu errado na vida de Aureliano Cantareira. Nasceu pobre, família modesta, estudou como desejava o pai, concluiu o segundo grau, ingressou em uma carreira pública como assessor de certo vereador do bairro, e daí fez faculdade, conheceu Rosinha, uma morena deslumbrante e ao seu lado deu passos largos e tombos inevitáveis. Perdeu tudo, de Rosinha ao chaveiro do carro.





Passou a vagar aqui e ali, morando em pensões baratas, comendo quando podia, capinando um quintal, coletando sucatas, enfim, conheceu o lado dos desvalidos até a velhice, que viu chegar lenta e progressivamente dolorosa. Ao fim, acomodado em um asilo municipal, com melhor conforto do que vivera nos últimos trinta anos, passou a ter tempo para refletir sobre sua vida.





Onde deu errado? Por que tudo teve que acontecer desta forma? E chorava, meditava, refletia, porém a resposta não vinha. Um dia chegou no horário de visitas um velho bem vestido, pletórico, e foi direto ao seu encontro. 





- Olá Aureliano.


- Olá... nos conhecemos?


- Sim, nos conhecemos.


- Sério? Qual o seu nome?


- Rafael. Não se lembra de mim? Brincávamos na infancia, eramos amigos em tudo, inseparáveis.


- Verdade? Bom, a que devo a honra da sua visita, Rafael?


- Você tem se cobrado muito pelo motivo pelo qual está aqui, como tudo aconteceu, então quer uma resposta para suas divagações, e eu vim responder. Pode perguntar.


- Como você sabe disto? Eu não te conheço e você sabe meu nome e minhas angústias?


- Pergunte, Aureliano, não tenha medo.


- Você é Deus?


- É assim que me vê?


- Não sei, está tudo tão estranho, você aqui, esta conversa...


- Eu sou o que sou  estou aqui para cumprir com minha obrigação.


- Você faz truques? faz mágicas? Multiplica as coisas? Faz aparecer dinheiro do nada?


- Aureliano Cantareira, você é um incorrigível perdedor. Pare com suas dúvidas e questionamentos superficiais e arrisque saber a verdade.


- Está certo. Estava com medo de você, medo da verdade. Passei a vida com medo. Diga, Rafael, onde errei?


- Onde errou? Você é um tremendo de um filho de uma puta, um pulha, um asqueroso dejeto humano, você é uma bosta seca no pasto árido, inútil e idiota.


- Mas o que é isto? Veio aqui chutar um velho derrotado?


- Derrotado hoje, mas no dia que roubou meu emprego na Câmara e a minha namorada, Rosinha, eu jurei que iria destruir a sua vida. E me dediquei à esta obra por cada segundo que passou desde a semente do ódio germinada. Eu destruí você, Aureliano. E agora? Vim te dizer que prometi e cumpri. Vai tomar no c*, Aureliano.


- O que você ganhou com isto, qual é a moral desta história?


- Ganhei a liberdade de vim te dizer que você é um cagão e a moral da história é que não há imoralidade entre fazer e destruir um imbecil como você. Adeus, babaca.


- Rafael, espere, não vá ainda, preciso te dizer uma coisa...


- Fala, farrapo.


- Muito obrigado por tudo, ninguém nunca havia feito nada por mim e você dedicou toda a sua vida à minha vida.   


- Vá à merda, Aureliano, e retire este sorriso cínico do rosto, por que se não o fizer eu farei de tudo para removê-lo.


- Rafael... escute... Rosinha não valia isto tudo, acredite.


- Eu sei, esta é a minha ira. Quando finalmente a tive nos braços, descobri o quanto você estava feliz por te-la perdido. Eu te odeio, Aureliano...





É isto aí!

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