Alto lá, antes que falem de plágio, confesso:
É plágio o titulo desta postagem.
Antecipo que é leitura imperdível (toda a obra dele é imperdível)
Feitas as considerações merecidas, vamos ao eu em mim e em si, comigo mesmo:
Foi tudo muito doido. Experimentei um sonho ou aparição ou incorporação ou acolhimento com um poema do Manoel de Barros. Era uma poesia surrealista e disrruptiva (neste momento pauso para corrigir o corretor gramatical que desconhece a palavra Disrruptiva, insistindo em Disrruptivo. Fico imaginando Manoel de Barros vendo uma coisa capciosa desta natureza, onde só o masculino é disrruptivo. Ele sempre dizia que a "Poesia não é para compreender, mas para incorporar. Entender é parede; procure ser árvore".
Quer coisa coisada mais disrruptiva que isto? (neste momento o corretor trocou coisada por coitada - acho que o sistema está possuído pelo politicamente correto - SQN)
Antes de chegar no poeta e na sua poesia, devo esclarecer que no sonho vagava por uma alameda de árvores estranhas com flores bizarras, e nelas tinham cartazes balançando ao vento, pendurados por fios de nylon (ainda existe isto?) nos seus galhos bizarros. Em letras discretas, em tom pastel sobre um fundo azul, diziam:
Se se quer, trago a pessoa amada em três dias, faço amarração para seu amor hoje ou trago seu amor de volta em um dia - Tratar com Mariah Lilás 5599 012013015
Resolvi ligar para Mariah Lilás, sei lá o motivo, deu vontade, senti alguma esperança. Do outro lado uma voz doce, delicada, adocicada, inebriante atendeu e agendou um encontro para aquela mesma manhã, numa casa próximo onde estava. Segui o perfume do celular e cheguei extasiado até a porta da voz doce e delicada.
Mulher linda, educadíssima, antenada, descolada, e apaixonante. Nos acomodamos um de frente para o outro, numas confortáveis e relaxantes poltronas. Olhou no fundo dos meus olhos e deliciosamente indagou:
- Como posso ajudá-lo?
- Tentei responder sem tirar os olhos de toda a forma mulher dela, mas as palavras não saiam.
- Calma, feche os olhos, imagine-se num lugar deserto. Respire fundo, isto, agora fale.
- De olhos fechados, sei lá, aconteceu algo estranho, incorporei a
Elegia de seo Antônio Ninguém, do Manoel de Barros (foi aí que entrou o mestre poeta no meu sonho). Declamei o poema com sentimento de alma sofrida, chorei aos borbotões, engasguei, solucei e desencanei o desencantamento guardado a muito tempo, uma vida entalado na dor e na angústia, ali, diante daquela mulher estranha e linda.
Busquei a complacência da mulher e muito assustado disse - Olha só, estou estranho, há uma voz querendo desabafar de tal maneira que está desgrilhoando de mim, sinto que estou querendo atravessar meu corpo e atingir este espaço, ao qual só agora percebo que privei do direito de senti-lo. Não sei por que falo isto, mas ... está saindo da minh'alma ... me transcende ...
Sou um sujeito desacontecido
rolando borra abaixo como bosta de cobra.
Fui relatado no capítulo da borra.
Em aba de chapéu velho só nasce flor taciturna.
Tudo é noite no meu canto.
(Tinha a voz encostada no escuro. Falava putamente.)
Estou sem eternidades.
Não tenho mais cupidez.
Ando cheio de lodo pelas juntas como os velhos navios naufragados.
Não sirvo mais pra pessoa.
Sou uma ruína concupiscente.
Crescem ortigas sobre meus ombros.
Nascem goteiras por todo canto.
Entram morcegos aranhas gafanhotos na minha alma.
Nos lepramentos dos rebocos dormem baratas torvas.
Falo sem alamares.
Meu olhar tem odor de extinção.
Tenho abandonos por dentro e por fora.
Meu desnome é Antônio Ninguém.
Eu pareço com nada parecido.
Abri os olhos e vi que a mulher linda estava em lágrimas quando acabei com a expiação da palavra. Levantou quase levitando, veio ao meu encontro, e eu ali, trêmulo, desentendido das coisas ocorridas naquele ambiente acolhedor. Tomou minhas duas mãos e sentenciou o que foi minha cura. Disse com tanta candura, tanto amor, tanto carinho, que ocorreram em mim um conjunto de sensações de gozo, percepções e representações surrealistas, de caráter ora confuso ora coerente:
O senhor perdeu foi o amor próprio, e não vai encontrá-lo fora do seu querer, no mundo exterior. Apaixone-se por sua Alma, e creia na unidade da alma com você.
Aí pisquei os olhos e ao abri-los estava acordado. Ali, às margens do chão frio da minha cama, sentei e chorei com saudade de mim mesmo. Resolvi que tenho que me reinventar. O reinvento é o refazer dos inventos, portanto deveria ter perguntado à mulher, mas não perguntei que se reinvento é por que o invento é falso e não serve mais, aí reinvento para ser verdade. É isto? Não seria o contrário? Não, espera! Caramba, preciso reencontrar aquela mulher... vou dormir mais u pouco para ver se ela volta.
É isto aí!