quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Palavras que rimam com você - V

 


Sonho lúcido 
corpo mente 
só nós dois, 
harmônicos 
metais nobres, 
sendo fundidos 
num cadinho 
fogo e paixão.

É isto aí!




quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Isso é amor, e desse amor se morre!


(Juiz) Senhoras e senhores, membros do Júri deste Tribunal da Consciência, hoje julgaremos o réu, aqui presente, pela acusação de ter decidido romper com seu amor eterno, buscando eliminar a saudade, a angústia de quem ama, a tristeza, a melancolia e o complexo elo com a outra parte, que segundo consta dos autos, guardou consigo toda a candura deste amor.  

Feito o introito, passo a palavra ao Promotor de Justiças Passionais:

(Promotor) Meritíssimo Juiz da Consciência, Inconsciência e afins, a Promotoria trabalha na tênue linha de que "se se morre de amor não se morre, quando é fascinação que nos surpreende" como ponderou Gonçalves Dias em legítima e explícita conjugação do verbo amar.

Concluindo este introito, ainda navegando nos ares passionais de Gonçalves Dias, assim o disse na sua autoridade poética aqui citada de forma plana, sem redondilhas, pois não se trata de um sarau:

Sentir, sem que se veja, a quem se adora; Compreender, sem lhe ouvir, seus pensamentos; Segui-la, sem poder fitar seus olhos; Amá-la, sem ousar dizer que amamos; E, temendo roçar os seus vestidos, Arder por afogá-la em mil abraços: Isso é amor, e desse amor se morre!

(Juiz) Com a palavra o nobre advogado dativo da defesa;

(Defesa) Meritíssimo, "Para sempre" é um tempo que não existe. Aqui ouso citar o gênio da sétima arte, o grande Charles Chaplin, a quem esta frase é atribuída, apesar de controvérsias poucas, mas há. Bem, a intenção aqui é explorar a linha de raciocínio do réu, e segundo Chaplin: "Nada é para sempre neste mundo, nem mesmo os nossos problemas" .

(Promotor) Protesto, Meritíssimo. Não temos provas suficientes para garantir de que Chaplin disse isto. E se o disse, não foi, com certeza, em português.

(Juiz) Negado. Prossiga a Defesa.

(Defesa) Senhores e senhoras membros do Júri, o "Para sempre" é de tal de maneira imaterial e desalinhado com a vida, que desindentifica o amor com a real e/ou (que  se danem as redundâncias, já que não bastam a abundância de ausências) suposta saudade carregada cada vez mais dentro de si mesmo com suplício. 

Da mesma forma, deparamos nos autos com estas duas palavras simples, que de uma maneira univitelina, quando juntas, transformam-se num ato de penitência: Falo da sentença social do  "Nunca mais".

O "Nunca mais" surge nas intempéries da dor como um ato indefectível, que não falha, insidiosamente incontestável e infalível. Todos aqui sabem que quando e enquanto se ama alguém, não há o que se pode destruir. Cremos piamente, de forma intuitiva,  que pela natureza elementar e natural das coisas, o amor sempre existirá; será eterno, imutável, indestrutível, imperecível. 

(Promotor) Protesto, está generalizando os sentimentos

(Juiz) Negado. Prossiga.

(Defesa) Pergunto à consciência de cada um neste tribunal, aos membros do Júri e ao Meritíssimo Juiz

- Senhores, quem suporta uma dor assim tão intensa? É possível, no centro de um furacão de sentimentos dolorosos, focar em pensamentos positivos e atos altruístas que teriam a responsabilidade de criar uma nova realidade sem vínculos ou sequer vestígios com a atual?
  
- Senhoras, quem nunca pensou em se entregar à paixões extemporâneas, buscando uma rota de fuga sem eixo de gravidade, sem chão, sem mobilidade tangencial para fugir deste tempo de angústia profunda?

- Quão dolorosa e' a via aos que permitem entregar-se de corpo e alma às repreensões fúteis ou inúteis da sociedade, sufocadas por choros secretos e rotinas maçantes?

(Juiz) Conclua, por favor

Prezados membros do Júri, Meritíssimo, não condenem este homem duplamente pelo mesmo ato. Ele já foi julgado e condenado pela sua experiência pessoal. Deixem-no ir, pois a ausência já o condenou a ser infeliz neste continuum  de dor.

(Juiz) Culpado. Condenado ao ad aeternum da angústia dos que amam. 

É isto aí!

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Cafubira, o contador de casos



Ô Cafubira, conta aqui pra turma sobre a vez que você encarou uma onça na mão.  

Nossassenhora, essa é fantástica. Foi assim - Estava andando a horas caçando a onça. No cansaço acabei dormindo numa pedreira. Acordei assustado com o canto com ruído grave e ritmo leve de uma coruja, anunciando a morte de alguém. Passei a mão no chão e senti que estava orvalhado. Aquilo era estranho. Abri os olhos bem devagar e pela luminosidade da lua crescente não reconheci o ambiente. Havia uma sinfonia de insetos, pássaros seguidos de silêncios espasmódicos. Só pode ser um daqueles sonhos malucos que vez ou outra me visitam, pensei. Nisto, de repente... 

Credo, Cafubira, você floreia demais.

Floreio nada não, eu vivo a vida intensamente. Agora atrapalhou até a minha linha de raciocínio. Onde eu parei?

Você parou falando - de repente ...

Então, de repente, quando dei por mim, adentrei na sala da casa do Tenorinho, tio da Zeldinha, cunhada da Virgulina e dei de cara com o velório da Virgulina. Crendeuspai. Aquilo foi um baque terrível. Até na noite anterior nós dois nos amassávamos de amor apaixonante no paiol velho do Zé da Noca. Eu assustei ao ver Virgulina, a moça mais bonita do mundo, morta e minguadinha, coitada. Aquela tripinha lerda estirada num esquife de pinus, cheio de brocas e manchas de sebo. Quando aproximei do corpo, a danada arregalou os olhos, segurou apertando minha mão e falou sussurrando - Cafubira, guardei o bilhete premiado da loteria atrás da ... e acabou remorrendo de novo, travando minha mão na dela, e quase que me levou pelo susto.

Cafubira, para com estas histórias, onde já se fui defunta ressuscitar e remorrer?

Aí, vocês tudo pedem para eu contar a verdade e atrapalham de novo. Quer saber como termina ou não?

Está bem, Cafubira, conta aí o resto da história.

Onde que eu parei?

Disse que a sua mão estava travada com a dela.

Ah, lembrei! Estava dormindo na rede do alpendre. Aí minha mão deslizou e parou na mão dela, senti a maciez e o carinho das sua carícias. Puxei ela para o meu peito, travei seu corpinho macio nos meus braços, puxei com força mesmo e a danada veio facinha facinha. Fomos às inimagináveis loucuras de um amor atemporal, forte e contagiante. Acabamos dormindo agarradinhos, e tudo se deu com total volúpia. Fui sendo acordado com total carinho por ela, já  de manhãzinha, ainda sem sol. Quando abri os olhos, era a onça que estava matando as galinhas do quintal. Expulsei a doida a tapas, chineladas e empurrões. Voltou mais uma vezes, a danada, e depois foi sumindo aos poucos.

É isto aí




quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Papo de Esquina 16/outubro/2024


- Por qual razão existem as guerras?

- Deve ser para estarmos sempre tristes, ou angustiados, ou ansiosos, ou coléricos, ou traumatizados, ou endividados ...

- Ou depressivos, ou embriagados, ou alienados, ou submissos, ou desinformados ...

- Acho que vou para casa chorar escondido

- Eu, eu ... não sei para onde ir, eu acho, não sei, deve ser isso ...

- Eu vou ali, mas antes vou tomar alguma coisa ...

É isto aí!


terça-feira, 15 de outubro de 2024

Cartas de Amor LXXXVII


Reino da Pitangueira,
Planeta Terra&Lua,
3° do Sistema Solar,
Via Láctea, Zona Sul


Querida, somos feitos de orações coordenadas.

Calma meu bem, sei que sua ansiedade a corrói feito uma saudade dolorida, por isto peço que inspire lentamente pelo nariz e expire com naturalidade pela boca, acompanhando o movimento da minha mão direita. Inspire ... expire .. inspire... expire .. não pire ... vai, isso, muito bem, adoro seus olhinhos brilhando na minha memória.

Sei que ao ler o enunciado desta carta, pensará que me refiro às infinitas e extensas  ladainhas e orações coordenadas pelas suas tias Belinha e Estelinha, para purificação da mente e do corpo, em saudosos tempos infanto-juvenis. De certa forma, poderia ser este o caminho para propósitos salvíficos pessoais, mas em outra época e de outra forma adentraremos no mérito desta ação de cunho celestial.

Hoje prefiro falar-lhe no âmbito da sintaxe. Creio que somos orações coordenadas, no sentido gramatical, ora sindéticas ora assindéticas. Nossas ações, nossos verbos, nossos versos, olhares, afagos e saudades são misteriosamente  independentes entre si quando não precisam de outras orações para serem completamente compreensíveis. Nosso amor, mesmo que apareça junto de outra oração, pode ser entendido na sua existência, sem ela.

Queria que esta carta fosse um beijo, então que seja, pronto, é o beijo que o beija-flor há de dar em você ao lê-la. Somos nossas orações coordenadas, querida, é isto que somos. Um cafuné no cabelo, um afago na face, um beijo apaixonado e um abraço apertado.

Lembre-se sempre, meu bem, que nossas orações não estão, necessariamente, ligadas por conjunções, mas justapostas, ou seja, uma ao lado da outra, feito nosso destino.

P.S. Se der ou se for possível, mandarei notícias do mundo vindouro.

Saudades

É isto aí!


segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Cartas Avulsas XVI

 


Reino da Pitangueira, 
14 de Outubro de 2024
Por do Sol às 17h52min
Lua na fase Crescente
Estação Primavera


Apesar de, resolvi escrever esta carta. Nada de especial nela, a não ser o rompimento do silêncio.

Sou do tempo em que as cartas eram o que de melhor existia para cobrir distâncias com informes sobre tudo e todos. Receber uma carta era mais do que receber uma visita para o café. Era assunto para ser analisado nas formas, no candor; na análise do quão de  sinceridade e franqueza exteriorizavam no texto. Afora isto, sem recursos maiores do que os livros que atravessavam pelo menos duas gerações, cabia ainda estabelecer relações de sentido e de dependência entre palavras e orações.

Dito assim, não sei como as cartas caíram no desuso de maneira tão abrupta. Ler uma carta exigia dar o máximo de sinapses no Hemisfério esquerdo, que é responsável pela linguagem, raciocínio lógico, cálculos matemáticos, escrita e leitura, enquanto o Hemisfério direito, responsável pela criatividade, emoções, percepção de sons musicais, trazia no campo visionário da saudade o reconhecimento da face vinculando-o ao pensamento intuitivo.

Desta forma, o contorno da alma do/da remetente ia sendo aos poucos materializado e sensorialmente metabolizando um tempo único e privativo, numa outra frequência, numa outra dimensão, numa outra vida destas muitas que habitam em nós, eliminando as distâncias e as intempéries entre um problema  e outro. Enfim, espero ter superado as correntezas do rio de problemas que atravessam o nosso caminho e que se recusa a evitar já à jusante a inundação dos sonhos. 

É isto aí!




sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Indo e voltando ao lado do lado

 

Não sei como será ainda 

o formato deste espaço 

onde reina a Pitangueira. 

Muitas águas passaram 

e eu ainda do lado da ponte, 

que é o lado de cá 

vendo o mundo ao largo 

onde não há certo nem errado, 

só há.


Bem vindo! Não posso prometer flores nem água gelada.

É isto aí!