domingo, 24 de julho de 2016

O analista da Pitangueira - Mãe não corre!

- Posso contar um sonho que tive?

- Sim, claro, por favor.

- Sonhei que estava num campo verdejante, daí apareceu uma enorme vaca, corri muito, mas então ela me alcançou e começou a me encarar meio esquisita ... sabe o que isto significa?

- Vamos ampliar o leque de percepções. Talvez na próxima sessão tenhamos uma resposta que melhor represente este fato, ok? Seu tempo acabou, até mais.

Na próxima sessão:

- Tive outro sonho. Mas achei tão esquisito.

- Fique à vontade. Se perceber nele alguma importância e se sentir confortável em relatá-lo, sou todo ouvidos.

- Eu estava no quintal da minha casa da infância, brincando de barro. Mas o interessante era que o quintal era enorme. Havia nele uma vaca plácida, abanando o rabo, olhando para o infinito e curtindo a sombra da mangueira que a vovó plantou. De repente ela se assustou com a chegada de um homem alto, escondido sob uma enorme capa preta e um chapéu imenso. Correu para a fuga, parou bruscamente na minha frente, olhou nos meus olhos, olhou minhas mãos sujas, lambeu meu cabelo até ficar penteado, meio que lambido de vaca e .. caramba, lambeu minhas mãos até ficarem limpas. Então, doutor, é grave?

- Se é grave ainda não sabemos, mas no sonho anterior acatei o palpite, joguei a vaca no milhar e faturei trinta mil na cabeça. Então decidi dividir com você. Toma aqui seus quinze mil.

- Nossa, muito obrigado, senhor, puxa vida. Valeu!! Então, e hoje? Jogamos de novo?

- Não, hoje não.

- Mas por quê?

- Mãe não corre ...

É isto aí!

Papo de Esquina XXIV

- Tenso ...

- Muito tenso ...

- Bastante tenso ...

É isto aí!

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Carminha e Armandinho - Discutindo a relação aberta

- Posso te perguntar qualquer coisa, Armandinho?

- Claro, Carminha, nossa relação é aberta. Não tenho nada para esconder.

- Bem, então vamos falar das mulheres que passaram pela sua vida, pelo menos das que tenho conhecimento e o que cada uma delas representou para você.

- Nossa, que assunto difícil. Mas vamos lá, minha história é sua.

- Isto, gostei do que estou ouvindo. Fale da Telma.

- Telma era completamente louca. Assim que a deixei, senti-me horrível pelo abandono de uma incapaz.

- Raquel?

- Devassa, devassa, devassa. Nunca entendi o mérito daquele relacionamento.

- Cristina?

- Retardada. Simples assim, retardada. Não deu conta da minha ausência nem quando fui embora.

- Lourdes?

- Espera aí. Eu já falei alguma vez qualquer coisa da Lourdinha? Como você sabe dela? Nossa, puxa vida! Com vou dizer algo sobre a Lú? Ela era gostosa demais da conta. Educadíssima. Linda, linda, linda. Chorei muito por muito tempo, mas a vida segue e a fila anda.

- Bem, pelo que sei, esta mocreia da tal de Lourdinha já casou e mora a oito mil quilômetros daqui. Mas é bom saber que ... deixa prá lá. E a Patrícia?

- A Pat? Caramba!! Doida doidona doidaça. Tomava uns ácidos e ficava ali sem eu entender nada de onde estava ou o que se passava.

- Jandira?

- Jandira ... Jandira ... engraçado, não lembro desta.

- Não se faça de bobo. Jandira é minha ex-melhor amiga de todos os tempos. Armandinho, e vocês estiveram juntos quando já estávamos juntos em momento de ligeiro afastamento. Seu safado, seu sem-vergonha, seu cachorro. Eu perdi a amizade que tínhamos desde a infância por sua causa.

- Mas como abriu mão de uma amizade assim tão forte, Carminha?

- Em primeiro lugar, ela rompeu com o trato entre as melhores amigas de nunca pegar o ex da outra. Em segundo lugar a outra sou eu. Em função disto, abri mão da nossa história batendo nela com a mesma vontade que estou de encher esta sua cara porca de tapa e pancadaria.

- Mas por quê não me falou? Por quê resolveu ficar na boa comigo, amor?

- A resposta não é fácil, mas saiba que melhores amigas sempre virão, mas otários héteros para pagar as contas, abrir a porta do carro, fazer comida e nos levar aos lugares que queremos são raros no mercado. E quieta o facho que isto não foi um elogio.

É isto aí!

domingo, 17 de julho de 2016

Os turcos, o Cruzeiro e a choldra

Eu ia falar do golpe na Turquia, mas os turcos estão bem adiantados na história, quando comparados à pátria amada, idolatrada, salve, salve. Têm pelo menos uns oito mil anos na frente. Foi na Turquia que Noé desceu da barca e desde então aquele belo país vem fazendo sua história.

Então, nada de falar de golpe, por que dá até vergonha o que se vê por aqui. É tanta falta de tanta coisa que dá nojo de saber que existem seres humanos capazes de se dar ao trabalho de serem tão maus e tão incompetentes ao mesmo tempo.

Enquanto isto, o Cruzeiro, glorioso e vencedor, vai cambaleando no cambaleante campeonato tupynambá. Vai cair para deleite da choldra, mas vamos que vamos, que a semana promete.

É isto aí!


sábado, 16 de julho de 2016

E a gente nada de confessar (Ana Larousse)




Alto lá!! Este texto é da Ana Larousse.

Confesso que achei danado de bom, copiei e colei aqui na Pitangueira. 


eu odeio
quando você não percebe 
que é pra você que escrevo, 
que é sobre você que escrevo 
e que é por você que me apaixono
um tantinho mais a cada dia.

odeio 
quando você sorri 
escondido 
enquanto eu sorrio 
escondida 
e a gente nada de se juntar.

odeio 
quando você 
sabe que me ama 
e descansa no medo 
de nos enfrentar.

odeio 
quando falamos 
de outros amores e, em seguida, 
saímos a roubar flores 
no ensaio de nos entregar.

odeio 
quando roubamos flores 
e deixamos todas murcharem 
na vergonha de nos desvendar.

odeio 
que você sabe 
e sabe tanto quanto eu 
que o meu amor te cabe 
e que o teu amor é meu.

odeio 
que a gente se pinte 
de amigo e brinque 
que vai casar

odeio 
que nos pertence, 
por agora, se esconder
quando tudo que a gente quer 
é ficar junto e olhar o mar
quando tudo que a gente quer 
é se viver e se amarrar
e a gente nada de confessar




sexta-feira, 15 de julho de 2016

Estou logo ali

É fato que ando fugindo do Blog, mas ele está aqui, bem diante dos meus olhos. Poderia falar mais de política, virar um Blog chato prá caramba, mas a política é muito maior do que o discurso de um vereador em véspera de eleição. Está além dos prefeitinhos de merdas e outros de merendas, tão em voga e em moda. Ultrapassa os governadores polidos e prolixos, as assembléias inoperantes, até chegar ao núcleo do poder.

Núcleo? Onde está o núcleo? Você sabe? Com certeza acha que sabe. Tem seus candidatos, tem seus preferidos, seus deputadinhos e deputadinhas, seus senadorizinhos e senadorazinhas, tem também um presidentinho ou mesmo até uma presidentinha. Até aí você vai, mas não passa desta linha amarela de checklist. Por que daí em diante, num labirinto complexo, ardiloso e capcioso, está o poder, o verdadeiro e real poder, que é inatingível a nós mortais.

Falar de amor? Todos amam alguma coisa, uns mais outros menos, mas amam, então, todos são doutos na arte de amor. O fato ém que estou logo ali,bem diante de mim, portanto, eu que me conheço há dezenas de anos, sei que esta fase de estar logo ali passa e logo logo estarei bem aqui.

Um abraço que volto em breve.

PS - A gravura acima é de Salvador Dali - Baby Map Of The World / 1939

The Platters - My Prayer


Imagem: The Platters



The Platters é um grupo vocal estadunidense, considerado "o mais bem sucedido dos anos 1950". Chegou a vender mais de 53 milhões de discos e está, desde 1990, no Rock And Roll Hall of Fame. Foi quem primeiro gravou o sucesso "Only You". Entre seus sucessos também se destacam "My Prayer" (composta por Georges Boulanger com o nome "Avant de Mourir"), "The Great Pretender", "You’ve Got The Magic Touch", "You’ll Never Know", "Smoke Gets In Your Eyes" (composta por Jerome Kern e Otto Harbach) entre outros.


O grupo foi formado por adolescentes em Los Angeles no ano de 1952, com o nome de "Flamingos", com uma formação inicial que não se manteve: Cornell Gunter, Gaynel Hodge e seu irmão Alex, Joe “Jody” Jefferson e Curtis Williams. O grupo passou por várias alterações na sua formação; o nome original teve ser trocado antes mesmo do lançamento porque um outro grupo, em Chicago, surgira como The Flamingos e, por sugestão de Herb Reed, adotaram o The Platters, referência ao nome dado aos discos de 78 rotações.

Em 1954, foram lançadas duas músicas do conjunto "Voo-Vee-Ah-Vee" e "Shake It Up Mambo" na gravadora Federal Records, sem grande sucesso; então, por intercessão do empresário Buck Ram foram contratados pela Mercury Records e em 1955 atingiram os primeiros lugares nas paradas com Only You e The Great Pretenders, fazendo assim o sucesso do grupo.


" My Prayer " é uma canção popular de 1939 com música do violinista de salão Georges Boulanger e letra de Carlos Gomez Barrera e Jimmy Kennedy . Foi originalmente escrita por Boulanger com o título Avant de mourir (Antes de morrer) 1926. A letra desta versão foi adicionada por Kennedy em 1939.

Glenn Miller gravou a música naquele ano para o segundo lugar e a versão do Ink Spots com Bill Kenny alcançou o terceiro lugar também naquele ano. Foi gravado muitas vezes desde então, mas a versão de maior sucesso foi uma versão doo-wop em 1956 pelos Platters, cujo lançamento em single alcançou o número um no Top 100 da Billboard no verão, e ficou em quarto lugar para o ano. Esta versão também alcançou o primeiro lugar nas paradas R&B Airplay e R&B Juke Box. 

A gravação dos Platters aparece no filme de 2008 O Curioso Caso de Benjamin Button , no filme Mischief de 1985 , no filme October Sky de 1999 , e em dois episódios da série de 2017 de Twin Peaks . A versão da música dos Ink Spots foi apresentada no filme de 1992 Malcolm X. Vera Lynn cantou a música no filme britânico One Exciting Night em 1944. 

A canção também virou tango na versão italiana da orquestra de Norma Bruni e Cinico Angelini (1940), " Sì, voglio vivere ancor! ". 


Fonte: Musixmatch
Compositores: Georges Boulanger / James B. Kennedy
Letra de My Prayer (Original artist re-recording) © Eschig Max Soc., Peter Maurice Music Co. Ltd., Bote & Bock Gmbh, Bote Bock Der Boosey Hawkes Bote Bock, Peter Maurice Music Co Ltd, Peter Maurice Music Co., Ltd.

When the twilight has gone
And no songbirds are singing
When the twilight has gone
You come into my heart
And here in my heart you will stay
While I pray

My prayer is to linger with you
At the end of the day
In a dream that's divine

My prayer is a rapture in blue
With the world far away
And your lips close to mine

Tonight, while our hearts are a glow
Oh, tell me the words that I'm longing to know

My prayer and the answer you give
May they still be the same for as long as we live
That you'll always be there
At the end of my prayer


quinta-feira, 14 de julho de 2016

A primeira novela da Pitangueira

A morte de César, Jean-Léon Gérôme (1867)

- Muito bem, vamos começar. Hoje vou fazer apenas a sinopse da nova peça que ensaiaremos. Todos já leram a peça? Já conseguiram entrar em seus personagens?

Sim, diretor ...

- Atenção, isto é uma ficção, não cabendo sequer comparação com a realidade de quaisquer pessoas, temas e fatos em todo o mundo. Tudo bem? Mas antes de começarmos... Tiago, quer fazer o favor de largar a boca, os braços e a bunda da Helena? Isto ... isto. Helena, quer fazer o favor de colocar sua roupa? Muito boa, digo, muito bem.

Como já sabem, esta peça trata de uma hipotética trama política interna de uma grande empresa. Helena fará o papel de secretária e o Tiago é o presidente. Nutrem um sentimento platônico. A personagem tem como seu grande amigo o Juca, um contínuo, e Tiago é casado com Telma Pavão do Rabo Dourado, a musa do Piscinão de Ramos. 

Senhor diretor ...

Pois não, Helena?!

Por que a moça é a secretária e o rapaz é o presidente? Não poderia inverter isto aí não? É de natureza machista este texto, da forma na qual se apresenta neste mundo tão globalizado

Helena, lindinha, meu bem, querida, isto é entre os produtores e o autor, tudo bem? Quem decide o que, quando, onde  por que são os produtores, e que cala e consente é o escritor, ok? Ator e atriz atuam e pronto.

Como viram a peça gira no amor platônico entre a Helena e o Tiago. A Helena é desejada pelo Juquinha, e para afastá-lo definitivamente da sua vida emocional, tomará medidas que poderão atingir o Tiago, e isto permitirá a todos, desde o porteiro ao síndico do condomínio, passando pelos lavadores de carro até os topa-tudo, terem ódio dele com ou sem motivo.

O Juquinha, por sua vez, que de bobo não tem nada ..., espera aí, Juquinha, tira esta merda deste fone do ouvido, por favor? Ok, muito bem.

Então, o Juquinha procura o Joãozinho, que disputou a vaga de presidência com o Tiago e perdeu por duas diretoras traíras, para auxiliá-lo na sua intenção, e para incentivá-lo bota pilha na possibilidade de anulação da posse do adversário.

Joãozinho, membro do Conselho Diretor, inflamado pelas multidões instigadas pelo Juquinha, entra batendo em todo mundo, querendo puxar o tapete do algoz de qualquer jeito, e acaba perdendo o contato com Juquinha e claro, também o controle das suas próprias ações. A coisa vai perdendo o foco, e amigos comuns começam a ter problemas com a empresa, com a família e com os negócios, graças às intrigas, denúncias e agressões entre as partes.

Um dia, Helena, num momento melancólico pró-Tiago, trama uma inversão de posição para enfraquecer e confundir os adversários malvados e conquistar o seu grande e verdadeiro amor. Convence a esposa do Tiago, Telma Pavão do Rabo Dourado  a assumir a empresa. A esposa, como filha única do dono, dá um pontapé na vaga preenchida pelo marido, assume o controle e multiplica o capital várias vezes.

Tiago fica a ver navios, no cais do porto e neste declínio de fraqueza, Helena buscará consolá-lo. Mas o que encontra é um homem sem brios, com baixa auto-estima, depressivo e chato. Perde o tempo e o rebolado. Ao retornar à empresa, descobre que Juquinha está no seu lugar e de caso com Telma.

Ao final da história, Joãozinho vai pagar pelos seus pecados de bobo da corte e é entregue aos leões para apaziguar os novos cristãos.

- Só uma coisa que não entendi, senhor diretor.

- Pois não, Helena?!?

- Quem é Gaius Octavius?

- É o senhor das trevas, o inominável, o maldito, a sombra dos labirintos da empresa, aquele que controla tudo e não pode ser controlado.

- Mas por que só ele vai pagar o pato?

- Não pelo que fez, mas pelo que sabe. Simples assim. Mas não se preocupe, a arte é apenas arte enquanto a vida segue e faz a sua parte. 

É isto aí!

domingo, 10 de julho de 2016

Faltam-me palavras, Carminha!

Preciso achar uma frase perfeita, pensou em completo silêncio enquanto se escondia no lavabo. Tenho que falar exatamente o que surtirá o efeito que espero que aconteça. Uma frase, apenas uma frase e serei o homem mais, hummm ... mais, ah! não interessa, esta frase será o ponto de mutação da minha vida.

10 minutos depois

- Armandinho!?!?!? Você está bem?

- Sim, Carminha, estou bem.

- Precisa de alguma coisa? Tem papel, toalha, sabonete? 

- Sim, Carminha, está tudo aqui.

15 minutos depois

- Armandinho, estamos te esperando. Você está passando mal? Precisa que chame socorro?

- Não, Carminha, estou bem. Já já estou saindo.

20 minutos depois

- Armandinho, estou perdendo a paciência. Abre esta porta agora.

- Calma, Carminha, já estou abrindo. Mas seus pais já foram?

- Como foram, Armandinho? Como foram? Nós estamos na casa deles.

- Caramba, tinha me esquecido disto. Estou saindo.

25 minutos depois

- Armandinho, ou você sai ou a porta será aberta. Minha mãe me entregou a chave reserva.

- Carminha, você está sozinha? (a frase, preciso encontrar a frase exata.)

- Sim, claro, pode falar, estou sozinha.

- Então, sabe como eu fico quando estou nervoso? Esta é a primeira vez que visito seus pais.

- Sei, você fica cheio de gases. É um horror.

- Pois é, eu hoje fiquei muito, mas muito nervoso com esta conversa de casamento.

- E daí?

- E daí ... (a frase ... cadê a frase?). Faltam-me palavras, Carminha.

- Armandinho? É comigo? Você quer terminar tudo? Você tem outra?

- E daí que eu me caguei todo, Carminha. Achei que era um peidinho, mas sujei a calça, cueca, meia, sapato, estou todo cagado ...

- Ufa, que susto, achei que você ia me deixar ...

É isto aí!

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Papo de Esquina XXV

- Alguém aí sabe os principais tópicos do plano de desgoverno do exomorfo mutante?

- Eu li que ele quer o fim do SUS, criando uma grande rede de proteção aos interesses privados, cobrando por tudo. No fim quem paga o pato é o pobre.

- Eu ouvi que vai aumentar a idade de aposentadoria dos pobres para algo entre 70 e 75 anos, mas se formos bonzinhos abaixa para 65, porém só vale para pobre. 

- Eu também  fiquei sabendo que tomou uns cogumelos azuis e viu que a única solução para a nação grande e deitada eternamente em berço esplêndido crescer, é o pobre trabalhar 80 horas por semana para sustentar a safadeza.

- Puta merda, este negócio vai dar pau!

É isto aí!

Papo de Esquina XXIV

Podem me citar aí três qualidades do exomorfo mutante?

Corrupto, ladrão, desonesto.

Canalha, cretino, bandido.

Credo, esta merda ainda vai dar pau!

É isto aí!

domingo, 3 de julho de 2016

O solfejo do professor de piano

Passou na casa de Sinhá Chica, onde tomou benção, passe e água. Desceu a galope a ladeira doas Aflitos, tomou a rua da Farmácia, atravessou em direção ao Beco dos Borges, passou pela estreita viela e entrou por uma porta velha, carcomida e pesada.

Lá dentro estava Delfina, a musa da sua vida, linda, cheia de graça e de consolo. Abraçou, beijou, beijou, beijou e deu-lhe a aula de piano para a qual era contratado pelo seu pai. Ao final do horário já não sabia mais onde estavam as oitavas, nem mesmo os pedais. Delfina tocava-lhe o coração sem sustenidos.

Saiu ofegante, continuou descendo o Beco até atingir a Rua Moleque, de onde avistava a casa azul com ipês amarelos na frente, onde logo logo estaria nos braços de Clotilde, esposa de Tenório, escrivão da guarda municipal. A digníssima senhora era sua aluna de canto, e em todos os cantos da casa já apalpara seus redondos e fartos motivos de canto lírico.

Refeito da atividade, voltou à caminhada, seguiu a passos largos pela Rua do Contra, subiu a Travessa dos Travessos, atravessou a pinguela do Córrego dos Macacos e entrou pela cozinha da residência dos Tevez, cujas filhas gêmeas eram fortes candidatas a participarem de um concerto regional de Bach, graças ao ilustre e dedicado professor e maestro da cidade.

Naquela tarde, enquanto ardiam em completa devoção à arte musical, a mãe, uma das mais distintas damas da sociedade local, surpreendeu aos três em intrigante menage por sob a calda do instrumento de origem alemã, de nome impronunciável. Arrumou-se no que pode e saiu em desvairada correria de retorno ao lar.

No entardecer frio e triste daquele dia, batem à porta. Eram os pais da gêmeas. Tremeu até a última célula do corpo. O homem tinha fama de bravo e historias de tiros por causas menores. Abriu a porta esperando a morte. O entendiado marido cumprimentou-o formalmente, mediu-o de cima a baixo, indagou com os olhos algo à esposa e perguntou se o distinto cavalheiro se incomodaria de dar umas lições particulares em sua casa à esposa, pois as meninas não queriam mais aprender piano e a mãe ficou convencida de que a presença dele na casa poderia melindrar o desejo das filhas.

Consentiu com um leve e trêmulo aceno de cabeça, enquanto três homens desciam um piano do caminhão parado à sua porta. Tamanho foi o desgosto pela rotina, que nunca mais repetiu seus feitos da mocidade. Casou-se com Delfina, manteve um relacionamento fiel e exclusivo com a mãe das gêmeas e foi infeliz para sempre.

É isto aí!



sexta-feira, 1 de julho de 2016

Não tem volta (Poemeu)



A moça pudica,
imaculada e santa,
ascendeu à luz
por um rapaz pudico,
imaculado e santo.

Tocaram-se,
trêmulos e
em pânico,
fremiram medos
dedos e suor
pelos flancos.

Tensos constritos
corpos aflitos.
Olham pro lado,
miram-se cúmplices
e roubam as mãos ...

Mergulham
à jusante.
Dão-se para sempre
enquanto dura
a vasante.

É isto aí!