As letras estão morosas hoje, não querem sair do atoleiro ao qual as joguei quando decidi aprender uma nova língua, e foi aí num destes embates entre a culpa, mea culpa e mea culpissima culpa que comecei a entender que a metonímia era o enredo do embate gravíssimo entre os povos que habitam minha mente. Sou o resultado de um conjunto de povos, pessoas, hábitos estranhos agora, neste presente momento, mas comuns outrora e vive versa.
Metade de mim veio do meu pai, metade da minha mãe. Até aí tudo bem. Mas o mundo que habito me formou em personalidade, emoções e percepções do mundo. Quando ao processo genético, meu pai teve pai e mãe e minha mãe teve mãe e pai. Em rápida conta, em apenas - aleatoriamente - dez gerações que me antecederam, tiveram que existir pelo menos mil e vinte quatro pessoas, sendo 512 pais e 512 mães. É claro que este número poderá ter personagens duplicados, dependendo dos costumes, guerras, estupros, interesses e hábitos de cada geração, mas não ocorrerá a variação do número de envolvidos para cada ato sexual gerador de vida.
Considerando a possibilidade de que nas culturas primitivas, quando os humanos acasalavam mais jovens e as expectativas de vida eram mais curtas, essa duração média de geração teria sido de cerca de 20 anos. Logo, dez gerações estarão apenas duzentos anos uma das outras.
Estamos no anos de 1822. Naquele tempo, além das aventuras do Imperador, 526 mulheres, em dezenas de locais espalhados pelo mundo, gerariam quinhentas e vinte seis crianças, pelo ato consentido ou não, por cerca de 526 homens. Estas minhas avós estão espalhadas pelos cinco continentes, a maioria na África, Europa, Oriente Médio e Américas.
Caramba, este deve ser o medo oculto para o cuidado com as palavras, pois ao empregar a metonímia, talvez não tenha entre elas algum tipo de ligação. Uma mulher germânica, uma sudanesa, uma árabe, outra palestina, uma portuguesa, outra guarani, uma lusitana, outra bretã, uma tupinambá, outra romena, uma crioula, outra galega, uma senegalesa, outra sudanesa, gaulesas, nórdicas, cretenses, moçambicanas, indianas, eslavas, enfim, uma mulher assim, fértil, sorri para sua cria pela cultura e raízes fixadas no chão de um canto do planeta.
E esta mulher guardou consigo parte do que tem em mim do seu DNA. Rogou bênçãos e pragas, foi feliz ou infeliz, mas semeou, fez sua parte. Escreveu sua história no livro da vida celestial.
Agora acho que entendo o risco da palavra dita, mal ou mau ou bem dita. São muitas vozes que habitam, muitos pais, muitas mães e todos guardados em mim. É muita responsabilidade. Melhor guardar as palavras.
Fonte da imagem: Geledes
É isto aí!
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