quinta-feira, 5 de maio de 2016

Ode ao Fígado - Pablo Neruda


"Tradução Livre Ao Pé da Pitangueira"

Modesto,
organizado
amigo,
trabalhador
profundo,
deixa-me te dar a asa
do meu canto,
o golpe
de ar,
o salto
de minha ode:
ela nasce
de tua máquina
invisível,
ela voa
partindo de teu infatigável
e fechado moinho,
entranha
delicada
e poderosa
sempre viva e obscura.
Enquanto
o coração sonha e atrái
a partitura do bandolin,
lá dentro
tu filtras
e repartes,
separas
e divides,
multiplicas
e engraxas,
sobes
e recolhes
os fios e os gramas
da vida, os últimos
licores,
as íntimas essências.
Víscera
submarina,
medidor
do sangue,
vives
cheio de mãos
e de olhos
medindo e transvasando
em teu escondido
quarto
de alquimista.
Amarelo
é o teu sistema
de hidrografia vermelha,
búzio
da mais perigosa
profundidade do homem
ali sempre
escondido,
sempiterno,
na usina,
silencioso.
E todo
sentimento
ou estímulo
cresceu em teu maquinário,
recebeu alguma gota
de tua elaboração
infatigável,
ao amor agregaste
fogo ou melancolia,
uma pequena
célula equivocada
ou uma fibra
gasta em teu trabalho
e o aviador se engana de céu,
e o temor se precipita em assovio,
o astrônomo perde um planeta.
Como brilham acima
os olhos feiticeiros
da rosa,
os lábios
do cravo
matutino!
Como ri
no rio
a donzela!
E abaixo
o filtro e a balança,
a delicada química
do fígado,
a adega
dos câmbios sutis:
ninguém
o vê ou o canta,
porém,
quando
envelhece
ou desgasta seu morteiro,
os olhos da rosa se acabaram,
o cravo murchou sua dentadura
e a donzela não cantou no rio
Austera parte
ou todo
de mim mesmo,
avô do coração,
moinho
de energia:
te canto
e temo
como se foras juiz,
metro,
fiel implacável,
e se não posso
entregar-me amarrado à pureza,
se o excessivo
comer
ou o vinho hereditário de minha pátria
pretenderem
perturbar minha saúde
ou o equilíbrio da minha poesia,
de ti,
monarca obscuro,
distribuidor de mel e de venenos,
regulador de sáis,
de ti espero justiça:
Amo a vida: cumpre! Trabalha!
Não detenhas o meu canto.

Oda al Hígado
Pablo Neruda

Modesto,
organizado
amigo,
trabajador
profundo,
déjame darte el ala
de mi canto,
el golpe
de aire,
el salto
de mi oda:
ella nace
de tu invisible
máquina,
ella vuela
desde tu infatigable
y encerrado molino,
entraña
delicada
y poderosa,
siempre
viva y oscura. Mientras
el corazón suena y atrae
la partitura de la mandolina,
allí adentro
tú filtras
y repartes,
separas
y divides,
multiplicas
y engrasas,
subes
y recoges
los hilos y los gramos
de la vida, los últimos
licores,
las íntimas esencias. Víscera
submarina,
medidor
de la sangre,
vives
lleno de manos
y de ojos,
midiendo y trasvasando
en tu escondida
cámara
de alquimista.

Amarillo
es tu sistema
de hidrografía roja,
buzo
de la más peligrosa
profundidad del hombre,
allí escondido
siempre,
sempiterno,
en la usina,
silencioso.

Y todo
sentimiento
o estímulo
creció en tu maquinaria,
recibió alguna gota
de tu elaboración
infatigable,
al amor agregaste
fuego o melancolía,
una pequeña
célula equivocada
o una fibra
gastada en tu trabajo
y el aviador se equivoca de cielo,
el tenor se derrumba en un silbido,
al astrónomo se le pierde un planeta.

Cómo brillan arriba
los hechiceros ojos
de la rosa,
los labios
del clavel
matutino!
Cómo ríe
en el río
la doncella!
Y abajo
el filtro y la balanza,
la delicada química
del hígado,
la bodega
de los cambios sutiles:
nadie
lo ve o lo canta,
pero,
cuando envejece
o desgasta su mortero,
los ojos de la rosa se acabaron,
el clavel marchitó su dentadura
y la doncella no cantó en el río.

Austera parte
o todo
de mi mismo,
abuelo
del corazón,
molino
de energía:
te canto
y temo
como si fueras juez,
metro,
fiel implacable,
y si no puedo
entregarme amarrado a la pureza,
si el excesivo
manjar
o el vino hereditario de mi patria
pretendieron
perturbar mi salud
o el equilibrio de mi poesía,
de ti,
monarca oscuro,
distribuidor de mieles y venenos,
regulador de sales,
de ti espero justicia:
Amo la vida: Cúmpleme! Trabaja!
No detengas mi canto

Pablo Neruda

3 comentários:

  1. Adoro essa Ode. Mas gostaria de saber a fonte da tradução.

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  2. Olá mmdeguti! Feliz 2021,
    Gratidão por visitar este Blog. Buscarei nas minhas anotações. Geralmente cito a fonte, é praxe. Assim que encontrar eu postarei aqui.

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  3. mmdeguti, não estou encontrando a fonte. Se tiver algum erro crasso, erro de tradução ou erro de interpretação, por favor, fique à vontade para nos informar, para que possamos providenciar a correção.

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Gratidão!