quarta-feira, 31 de outubro de 2018

O Analista da Pitangueira e as sessões oníricas



Olá! Boa tarde! Como estão as coisas e os acontecimentos que a trouxeram a este encontro?

Bem, tirando aquele coisado que não vou falar sobre ele, aconteceu outro negócio que fui muito esquisito, sabe? Esquisitérrimo prá mais de metro.

Negócio esquisito? Conseguiria ser mais específica?

Como vou te explicar isto? Hummm, vou tentar narrar a história cronologicamente, pode ser?

Sim, claro! Prossiga.

Era uma tarde chuvosa de teça-feira, destes tempos de tempestades e tormentas. Mas aí ele chamou no interfone e convidou para sairmos. Educadamente agradeci o convite, mas ficou insistindo, insistindo, e disse que queria sair comigo de qualquer jeito, mas fui determinada e recusei com veemência, e, claro, chorei por umas duas horas.

Chorou? Mas não foi esta a sua decisão?

Sim, mas eu me vi tão feia, tão horrorosa, que não consegui ir ao encontro dele.

Consegue definir "feia"?

Estava com uma sandália rasteirinha ridícula, verde limão fluorescente, com desgaste nos calcanhares, que estavam rachados e imundos, unhas postiças de gel com esmalte laranja neon, velho, descascando e borda azul turquesa.

Mais alguma coisa?

E o vestido? Nem te conto! Um vestido pavoroso, feito de pano de saca de açúcar cristal, cheio de mancha de café, manga, leite, chocolate, manteiga e outras coisas indefinidas. Fui ao espelho e voltei em pânico pelo menos umas cinco vezes enquanto ele falava ao interfone.

E quando você o dispensou e chorou, como se sentiu?

Então, aquilo era tão real, tão tangível, tão logico, que custei a me dar conta que era um sonho, veja só, tudo não passou de um sonho.

Olha só, que processo rico este. Quer falar sobre este sonho?

Bem, aquilo foi estranho mesmo, mas acabei rindo da situação. Liguei para ele na manhã seguinte e marcamos um jantar naquela quarta-feira mesmo. Cheguei em casa toda empolgada, fui direto para um banho completo, relaxante, pensando num vinho e coisas profundas sendo ele o sommelier e eu seu vinho raro.

Uau ... perdão, quer dizer, sim, prossiga ...

Bem, enquanto estava no banho, com os olhos fechados e espuma na face, ele entrou como um felino, e ao cruzar suas mãos na minha cintura, dei uma volta de 180° na velocidade da luz e no impulso ao me jogar nos seus braços fui parar no chão do quarto, só então percebi que era outro estranho e real sonho. 

Um sonho estranho e real... quer falar mais sobre isto?

Sim e não. Quer dizer, quero falar mais sobre isto, mas não agora, pois ontem à noite conversei muito com ele sobre estas coisas e o convenci a vir comigo hoje, e ele está lá fora caso o senhor queira falar com ele.

Onde é lá fora?

Como assim? Lá fora é lá fora, uai! É tudo onde não é aqui dentro.

Excelente observação. 

Como assim, excelente, doutor?

Se ele está lá fora neste momento, ele está verdadeiramente aqui dentro, por que não há o lá fora neste ambiente.

Nossa, fiquei confusa.

Esta é uma sessão onírica, reconhecida pela Escola Oficial Normal dos Analistas da Pitangueira, a ESCONAP.

Sessão onírica? 

Você, numa sincronicidade exorbitante, dentro do seu sonho, se permitiu entrar no meu sonho para fazermos esta sessão, onde ele que está lá fora, está dentro de você, e isto é uma coisa que ainda não fora revelada no mundo tangível.

Isto é um sonho? Seu consultório é ... é ... meu deus das coisas malucas, estou nua! Então é assim que o Universo conspira pelos meus objetivos secretos? Estou aqui nua e ... pela santa das causas paranóicas ... ele é você, meu analista é ele ... estou nua diante de você dentro de mim, que loucura é esta?

Calma. Há de convir que a ética impera aqui, a ponto desta sessão já estar debitada no seu cartão, em débito automático.

Mas é um crime, não pode fazer isto comigo!

Em verdade, em verdade, te digo que se não está escrito em lugar algum que é proibida uma sessão de análise onírica super locum in mentis et corporis , com a devida ciência e permissão entre as partes, logo ela não é ilegal, e de madrugada, na fase REM, custa quatro sessões.

Mas é imoral!!!!

Ora, ora, ora, você entra nua no meu consultório onírico, às três horas da manhã, falando que se encontra comigo há vários dias, eu a atendo, ouço cada palavra e percepção do seu mundo interior resguardado por uma conduta ética de moral ilibada, apesar de, e quer fazer o reclame de que não estamos fazendo uma análise real?

Mas é um absurdo. Um sonho é só um sonho. Você não tem o direito de me analisar dentro de mim.

Olha aqui, Sonhos Conectados é a última moda em Paris, Milão e Caratinga.

Bem, neste caso ...

Neste caso esta sessão terminou, até a próxima fase REM e ao sair cuidado com o degraaaaaaaau ... merda! Merdas acontecem.

É isto aí!









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