Todo mundo conhecia Valsa. Todo mundo incluindo a voluptuosa Martinha, moça prendada na arte de fazer arte. Valsa era um sujeito meticuloso, andar lento, movimentos calculados, roupa sem vinco e um jeito leve de ganhar a vida. Passos lisos, sorriso matreiro, enfim, um homem sem ponta solta como definiu o Souza da barbearia.
Ganhou este apelido na juventude, parecia uma valsa, diziam, era leve demais, harmônico. mas o tempo passa, os reclames ficam mais apurados e Martinha, a moça prendada e voluptuosa, entrou na sua vida. Certa noite estavam lado a lado, ombro a ombro, sentados no banco da praça da Matriz, e deu-se o diálogo que mudou tudo.
- Valsa, a gente não deveria estar conversando sobre alguma coisa?
- Martinha, concordo, fale sobre qualquer coisa.
- Sobre o que nós ainda não conversamos, Valsa?
- Olhou profundamente nos olhos de Martinha, mordeu o lábio inferior, coçou o queixo com a mão direita, respirou fundo e sussurrou - sobre aquilo.
- Sim, tem razão Valsa, nestes três anos, aquilo sempre nos deixou sem palavras.
- Sim, Martinha, você tem razão.
- Valsa, vamos comemorar o desaniversário de nunca falar sobre aquilo com uma gargalhada?
- Não sei, Martinha, não sei se deveríamos rir.
- Então começa, Valsa. Dê a sua gargalhada contagiante.
- Martinha ...
- Valsa, você está chorando? Valsa? Fala comigo! Valsa ... para, Valsa ...
- Martinha ...
- Valsa ...
- Martinha, eu, eu, eu ... perdi meu relógio.
- Perdeu aquele relógio? Ah, tadinho ... Valsa, não precisa se preocupar. Eu vou fazer hora para você.
- Jura?
- Juro. Mas só se você parar de chorar e conversarmos sobre aquilo.
- Valsa levantou-se chorando, despediu polidamente da voluptuosa Martinha e nunca mais foi visto.
É isto aí!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Gratidão!