quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

Ausência (Vinicius de Moraes - Rio de Janeiro , 1935)


Poema de Vinícius de Moraes
Fonte: Vinícius de Moraes - Vida e Obra/Site Oficial
Publicação: publicado em 1935, 173 p. 
Editora: Irmãos Pongetti - Rio de Janeiro

Forma e Exegese marca a continuidade da carreira de Vinicius de Moraes como poeta. Ainda com 22 anos, era o segundo livro do jovem que ainda se apegava ao Simbolismo como escola dileta na hora de fazer versos ou escolher temas. As várias dedicatórias do livro para Arthur Rimbaud, Mallarmé, Claudel ou Jacques Riviére, selam a aliança do jovem poeta com sua matriz literária francesa e nos mostra a filiação poética que Vinicius ainda cultivava. 

Apesar do universo simbolista e de sua ligação com o meio intelectual católico do Rio de Janeiro, o livro apresenta alguns primeiros passos em poéticas que lhe seriam usuais futuramente. Poemas como “Ilha do Governador”, sobre sua infância no bairro carioca, ou “A volta da mulher morena” destacam-se dos longos versos herméticos e transcendentais. Eles já apontam para um Vinicius mais tangível e cotidiano, e que, não obstante, daria à sua expressão ainda mais beleza e profundidade.

Forma e Exegese foi um claro passo adiante do jovem poeta em relação ao seu primeiro livro e conseguiu ganhar destaque no meio literário do período. Mesmo sem ainda ter na ocasião a amizade que construiria ao longo da vida, ele recebe publicamente críticas positivas de um então já maduro Manuel Bandeira. Com o livro, Vinícius ganha o prestigioso prêmio Filipe d’Oliveira.

Ausência (Vinícius de Moraes)

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Declamante: Júlia Sonati
Um estudo da palavra e do gesto.
Atriz: Júlia Sonati
Edição: Mary Kuhn
@i.g.n.e.a
Câmera: Toni Ferreira
Produção: Rush Vídeo

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