sexta-feira, 20 de março de 2020

Um vírus inteligente




A reportagem é de Elena Dusi, publicada por La Repubblica, 14-03-2020. 
A tradução é de Luisa Rabolini.
Fonte: Unisinos 

Existem vírus estúpidos e vírus inteligentes. Os primeiros, como o Ebola, matam rapidamente seus hospedeiros. Já os últimos, atingem a todos com sintomas leves. Mantêm as pessoas viajando, trabalhando e saindo de férias, apesar de alguns calafrios e o nariz entupido. Eles voltam para casa à noite com a família, não cancelam o jantar com os amigos marcado há algum tempo ou se jogam na empreitada esportiva para a qual haviam tanto treinado. Eles se espalham por todo o mundo até o nível da pandemia, declarado oficialmente pela Organização Mundial da Saúde em 11 de março. "A palavra parece sugerir que não há mais nada que possamos fazer para conter o vírus", explicou o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus. “Isso não é verdade. Estamos empenhados em uma luta que pode ser vencida se fizermos as coisas certas".

Rápido e esperto

O coronavírus que enfrentamos é um inimigo particularmente inteligente. 80% dos infectados apresentam sintomas leves. Parece que, nos diziam um mês atrás - mas parece que uma vida se passou - não mata certamente como os outros coronavírus da Sars e Mers. Por que se preocupar tanto, é uma gripe ou pouco mais. Enquanto isso, ele, sem ser visto pelos radares, viajava a bordo de indivíduos insuspeitos, com apenas sintomas incipientes ou completamente irrelevantes. E indo rápido, mostrava uma letalidade bastante baixa (3% contra 10% da Sars e 34% da Mers). Até triturar, com sua constância, os recordes de contágios e de vítimas dos muito mais agressivos coronavírus irmãos.

Território desconhecido

"Nós nos movemos em um território sem mapas", advertiu Ghebreyesus. Três meses após a descoberta da epidemia, não temos curas, não entendemos exatamente quem é contagioso, por que as crianças apresentam sintomas muito mais brandos que os adultos e por que as mulheres se saem melhor que os homens, nem sabemos quão bem fundamentada seja a esperança de que o vírus seja sazonal e acabe se eclipsando com a chegada da primavera. "Estamos enfrentando a ameaça número um do mundo", disse o diretor da OMS. "Um vírus pode ter efeitos mais poderosos do que qualquer ataque terrorista". Era 11 de fevereiro e parecia um exagero. Um mês depois, trancados em casa ou atrás das máscaras, prestando atenção à nossa volta e mudando de calçada caso tivesse alguém no caminho, percebemos como ele estava certo. Do outro lado, destaca Benedetta Allegranzi, diretora mundial do serviço de prevenção de epidemias da OMS, "as epidemias podem nos fazer superar o individualismo e redescobrir que somos um conjunto e temos responsabilidades coletivas". É muito improvável que o coronavírus nos prejudique diretamente. É muito mais fácil que nossas imprudências tenham efeitos que recaiam sobre os ombros dos outros: os doentes mais frágeis ou o pessoal do sistema de saúde.

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