domingo, 15 de agosto de 2021

Toco sua boca - Rayuela Capítulo VII (Julio Cortázar)


Alto lá.
Este poema não é meu
Confesso que copiei e colei
Fonte Pensador

Toco a sua boca 
com um dedo toco o contorno da sua boca, 
vou desenhando essa boca 
como se estivesse saindo da minha mão, 

como se, pela primeira vez, 
a sua boca entreabrisse, 
e basta-me fechar os olhos 
para desfazer tudo e recomeçar. 

Faço nascer, de cada vez, 
a boca que desejo, 
a boca que minha mão escolheu 
e desenha no seu rosto, 

uma boca eleita entre todas, 
com soberana liberdade, 
eleita por mim para desenhá-la 
com minha mão em seu rosto,
 
e que, por um acaso, que não procuro compreender, 
coincide exatamente com a sua boca, 
que sorri debaixo daquela 
que minha mão desenha em você. 

Você me olha, 
de perto me olha, 
cada vez mais de perto, 
e então brincamos de ciclope, 

olhamo-nos cada vez mais de perto 
e nossos olhos se tornam maiores, 
se aproximam uns dos outros, 
sobrepõe-se, e os ciclopes se olham, 
respirando confundidos, 

as bocas encontram-se 
e lutam debilmente, 
mordendo-se com os lábios, 
apoiando ligeiramente a língua nos dentes, 

brincando nas suas cavidades, 
onde um ar pesado vai e vem, 
com um perfume antigo 
e um grande silêncio. 

Então as minhas mãos 
procuram afogar-se no seu cabelo, 
acariciar lentamente a profundidade do seu cabelo, 
enquanto nos beijamos 

como se estivéssemos com a boca cheia de flores 
ou de peixes, 
de movimentos vivos, 
de fragrância obscura. 

E se nos mordemos, a dor é doce; 
e se nos afogamos 
num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, 
essa instantânea morte é bela. 

E já existe uma só saliva 
e um só sabor de fruta madura, 
e eu sinto você tremular contra mim, 
como uma lua na água.

Fragmento de Rayuela, de Julio Cortázar:


Fonte vídeo Youtube mariabuenog

Toco tu boca, con un dedo todo el borde de tu boca, voy dibujándola como si saliera de mi mano, como si por primera vez tu boca se entreabriera, y me basta cerrar los ojos para deshacerlo todo y recomenzar, hago nacer cada vez la boca que deseo, la boca que mi mano elige y te dibuja en la cara, una boca elegida entre todas, con soberana libertad elegida por mí para dibujarla con mi mano en tu cara, y que por un azar que no busco comprender coincide exactamente con tu boca que sonríe por debajo de la que mi mano te dibuja.

Me miras, de cerca me miras, cada vez más de cerca y entonces jugamos al cíclope, nos miramos cada vez más cerca y los ojos se agrandan, se acercan entre sí, se superponen y los cíclopes se miran, respirando confundidos, las bocas se encuentran y luchan tibiamente, mordiéndose con los labios, apoyando apenas la lengua en los dientes, jugando en sus recintos, donde un aire pesado va y viene con un perfume viejo y un silencio. Entonces mis manos buscan hundirse en tu pelo, acariciar lentamente la profundidad de tu pelo mientras nos besamos como si tuviéramos la boca llena de flores o de peces, de movimientos vivos, de fragancia oscura. Y si nos mordemos el dolor es dulce, y si nos ahogamos en un breve y terrible absorber simultáneo del aliento, esa instantánea muerte es bella. Y hay una sola saliva y un solo sabor a fruta madura, y yo te siento temblar contra mí como una luna en el agua.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Gratidão!