quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Gilda

A moça tinha quarenta e sete anos, solteira, funcionária pública no último grau de ascendência, sem perspectivas maiores, apolítica, apartidária e à espera da aposentadoria. Andava sem nenhuma ostentação, mas sua elegância natural garantia-lhe certa visibilidade. 

Nas suas angústias, de certa forma, sentia-se amada, mas também desamada, e apaixonada, embora permitisse sentir-se desapaixonada Nos últimos vinte e cinco anos havia ficado, namorado, embolado, desembolado, por várias vezes, sempre com o mesmo rapaz. Desde a faculdade esta paixão sempre foi super mal resolvida, e dela nunca vira a luz no final do túnel.

Frequentava sempre o mesmo salão, comprava sempre as roupas parecidas, tinha sempre sapatos no mesmo modelo, férias sempre na mesma praia, chamava sempre o mesmo táxi, ia sempre aos mesmos bares, restaurantes e conversava sempre com as mesmas pessoas sobre os mesmos assuntos.

Enfim, era feliz e ninguém tinha nada com isto, até que se encantou com Claudionor, um estafeta na pré- juventude. Feito louca, alucinada e criança, lambuzou-se do mel em deleite eterno por uma eternidade que perdurou por dias a fio.

Refeita das naturezas da paixão, retornou ao seu habitual amor mal resolvido, disputando a atenção do seu parceiro com a esposa deste e quem sabe com alguma outra que se deixou envolver com a peculiar habilidade sedutora dele.  

Findo mais um ciclo, voltou à rotina, até que conheceu Betão, um novo garçom do seu predileto restaurante, que achou-a em tudo muita coisa. Feito louca, alucinada e criança, lambuzou-se mais uma vez do mel em deleite eterno por um período infinito que durou uma eternidade de tempo finito, mortal e prazeroso.

Refeita das naturezas da paixão, retornou ao seu habitual amor mal resolvido, entre finais de tarde de sábados e nos horários possíveis durante o expediente.

Como um carrossel, voltou ao ponto de origem dos conflitos, e foi numa sala de espera de determinado analista que conheceu o Almeida, um discreto cavalheiro com seus cinquenta anos, divorciado, que era destes que pagam as contas, abrem as portas, oferecem flores, e não têm pressa e achou tudo muito intrigante. 

Quase se entregando a um relacionamento para toda a sua vida, percebeu que no quesito paixão ainda cabiam novas questões a serem levantadas, digamos assim, e então buscou novamente Claudionor e a roda girou ... girou ... e foi feliz para sempre!

É isto aí!


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