sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Sobre ilusões e virulências.


Envelheci uns dez anos nestes últimos doze meses, disse a senhora sentada ao meu lado no banco de espera do banco. Ao meu lado, duas cadeiras depois, ou dois xis salteados. Olhei para ela, e ia dizer-lhe que a conheço a pelo menos trinta anos e está com a mesma aparência, mas aí ela contestaria, pois argumentaria que nunca teve aspecto de velha, e ficaria bastante ofendida.

Dias depois, um senhor na minha frente, na fila do supermercado, virou-se para mim, mediu meus cabelos brancos e meu olhar míope e desabafou - sabe, perdi a libido nestes últimos doze meses, não consigo fazer mais  nada, nem com estímulo destes medicamentos milagrosos. Olhei para aquele homem se lamentando e me recordei das muitas vezes que o vi com muitas mulheres, que não a do lar. Apenas acenei com a cabeça, numa negativa de concordância, com aquele olhar de solidariedade antagônica.

No dia seguinte, na padaria, cumprimentei educadamente a senhora de vestido azul, surrado, que estava ao meu lado escolhendo os pães. Deu dois suspiros em falsete, olhou para mim e desabafou - queria tanto que tudo isto acabasse para ver meus filhos e netos de volta à minha casa. Estive para falar que conheço os filhos, moram na cidade vizinha e jamais vieram visitá-la em quaisquer datas importantes, incluindo as festivas. Quantas vezes fui em solidariedade assoprar as velas junto com ela nos seus aniversários solitários?!?! Preferi deixar que a ilusão a faça esperançosa.

Tempos de reflexão são sempre difíceis, porque olhar para dentro de si dói; dói muito! 

É isto aí!



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Gratidão!