quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Auto-análise do amor total

Estavam conversando assuntos diversos. O relacionamento não avançava e ela desejava atingir o coração do seu objeto de interesse, de preferência para sempre, e ele esquivava de todas as formas educadas possíveis. Foi então que resolveu perguntar:

- Porquê você está sempre tão distante? Não gosta de mim? Sou chata? Sou feia? Não agrada a minha presença?

Foi aí que ele, pela primeira vez, olhou lá na alma dos seus olhos, e os descobriu azuis e sinceros. Entendeu que deveria se abrir e assim, quem sabe, preencher o imenso vazio que o silenciava.

O que há entre o amor e a solidão? Iniciou com esta pergunta já engatando a resposta - é um mistério que nem poetas, nem analistas da alma e muito menos os românticos sabem responder. Eu já vivi um grande amor e tenho medo de revive-lo. Estávamos juntos há muitos anos, tivemos nossos momentos de felicidade, hiatos de mesmice, entraves de rotina e por fim eternas ondas de tristeza. 

Cada um destes processos teve suas atitudes características, algumas marcantes, outras pouco perceptíveis e outras bem ocultas nas sombras da paixão, por isto raramente reveladas. 

No princípio amamos como ardentes amantes, depois como eternos apaixonados, em volúpia interminável. À medida que este ciclo se esgotava, experimentávamos novas técnicas, filmes, estimulantes, acessórios e bebidas que mantinham acesa a chama. Parecia que iria ser assim para sempre.

Porém, quando dei por conta, entregamo-nos em estranha e silente pantomima. Nesta modalidade, sem compreender bem o que ocorria e sem diálogo, buscávamos a forma perfeita, a estética da linha do corpo, e através de gestos meticulosos, experimentávamos uma transfiguração surpreendente, passando um para o outro, através de ações corporais enviadas e captadas pelos gestos, um ardente ciclo de desejo e orgasmos. 

Mas ocorreu que, infelizmente, este período delirante foi apenas uma transição entre a felicidade e os entraves de rotina, que por sua vez trouxe consigo a mesmice, e o relacionamento oscilou entre desejos e dúvidas, daí os hiatos, que surgiam como um tipo de ausência entre dois atos plenos de amor total. Aos poucos fomos caminhando para o fim.  Passamos a ter dia da semana para nossos encontros íntimos, sempre com um ritual prévio de autorização; as carícias ficaram reduzidas, os beijos mais técnicos e o olhar se perdendo entre os cada vez mais raros olhares de cumplicidade.

Então ela chegou - a tristeza, sim senhor, ela chegou, e junto com ela a inevitável morte daquele amor. Não havia mais brilho, o corpo já rejeitava o outrora complemento. Os sorrisos eram amarelos e raros. E agora só restou este vazio imenso em mim. Não há solidão, sabe, há um vazio total. Um imenso espaço cheio de nada. Estou repleto de um gigantesco nada.

Houve um silêncio intangível. Ela, em lágrimas discretas, procurou com seus olhos azuis uma porta na vida dele, que pudesse ser aberta. Buscou o seu olhar até que o encontrou. Respirou fundo, e tirando uma segurança que só o amor explica, abraçou-lhe. Que o tempo providenciasse sua história de amor, pensou.

É isto aí!

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