terça-feira, 14 de dezembro de 2021

As pudicícias do Seu Zequinha


Quando era menino, estava ao lado do meu pai, quando ouvi de certa feita esta história contada pelo filho caçula do Seu Zequinha, um famoso fazendeiro rico da nossa pequena cidade, conhecido pela sua bondade e honestidade. Homem rigoroso, justo e tirado a dar lição de moral aqui e ali. Meu pai fazia negócios com ele e sempre manteve o vínculo comercial com a família. 

Como está sua mãe, seus irmãos?

Olhou para meu pai com os olhos tristes e mais uma vez contou:  

Como o senhor sabe, meu pai recebera, cerca de uns três meses atrás, um telegrama para comparecer urgente na semana seguinte na casa dos seus avós paternos, a cerca de seiscentos quilômetros dali. Não daria tempo para ir a cavalo, pois na marcha máxima, em uma semana teria se movimentado apenas metade do caminho. Sabia que eles sabiam disto, e não viu uma solução a curto prazo, já que não havia outro modo de transporte. Ou iria a pé ou a cavalo. Mas a pé levaria cerca de trinta dias. 

Foi ao correio e ditou um telegrama de resposta - estou partindo hoje mesmo com meu melhor cavalo levando um burro de carga, carregando dois cachorros, um gato, três periquitos, um casal de patos e seis galinhas poedeiras. Além disto, numa pequena charrete, puxada por duas mulas, seguirão a esposa e os quatro filhos, além de três porcos e uma leitoa.

Dali a três horas recebeu outro telegrama - Zequinha, meu neto, não se apresse. Deixe seus animais em paz no recanto da sua casa e venha sozinho, daqui a quinze dias, assim virá mais tranquilo e seu cavalo estará mais descansado.

Saiu logo depois do almoço, deixando recomendações para a esposa e os quatro filhos sobre a obrigações da roça. Prometeu retornar em dois a três meses, mas manteria a família informada. E era até um prazo razoável, considerando o período de chuva. Passou na venda e na farmácia para deixar autorizadas as despesas que por acaso surgissem, e partiu na jornada prevista.

Ao entardecer do final da viagem, segundo contaram, de longe avistou o sobrado pomposo, imenso, ainda mais bonito, jardins bem cuidados e flores nos beirais de todas as janelas. Tudo muito bem arrumado, mas não avistou ninguém com quem pudesse trocar sequer um aceno. Caminhou para a porta principal, tocou a campainha e não escutou som algum. Aguardou mais um pouco, tocou novamente e resolveu verificar se a porta estava aberta. 

Pessoas daquela região que passaram lá em casa, diziam sempre a mesma coisa: Papai girou a maçaneta e a imensa porta rangeu alto, além de estar muito pesada, provavelmente pelos anos sem manutenção, pensou. Com muita dificuldade, conseguiu abri-la. A casa perfumada, tudo limpo, e estranhamente deserta de pessoas. Não ouviu nenhuma voz. Sentiu um arrepio no corpo, voltou para a porta - estava trancada, sem chave. Tentou umas, duas três janelas, todas travadas. Do medo veio a coragem de vasculhar o ambiente. Não encontrou nenhuma pessoa, e desapareceu  até ontem, pelo menos era o que acreditávamos.

Digo isto por que exatamente ontem, o seu Agenor da Banca apareceu lá em casa mostrando uma revista semanal, com papai num baile de carnaval junto com uma mulher desconhecida, no Rio de Janeiro. 

Fonte da Imagem: Foto: Meyer Pfundt/BIPs / Getty Images

É isto aí!

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