Sai cedo para o trabalho, senti um mal estar repentino, estacionei o automóvel em frente a uma garagem, mas esta parte entra no fim da história. Senti uma tontura estranha, e frio, um frio chato, apesar do dia estar quente. Vi na calçada, acenando para mim o tio Pascoalino. É o irmão da minha avó, pensei. Quanto tempo não o vejo. Sai do carro e fui ao seu encontro, ao lado dele estava a Naná, sua filha, prima mais velha da minha mãe.
Percebi que andava com muita dificuldade. Minhas pernas estavam pesadas, passo arrastado, e aí, quase em câmera lenta, lembrei que não o via por que ele faleceu há uns 30 anos, mais ou menos e a Naná há uns 20 anos. Será que é uma alucinação? - pensei -. à medida que com muito esforço caminhava na direção deles, apareciam mais pessoas. Vovô e Vovó, tia Catarina, Nestorzinho, Pretinha e Goreth. Até a Eulália, que me fez sentir o gosto da maçã pela primeira vez, ah! Eulália, ainda me lembro daquele beijo.
Senti uma emoção enorme. Pensei em contar tudo para minha mãe, busquei o celular no bolso e estava vazio. Quando estava próximo da Eulália, uma luz intensa nos abraçou, não saberia falar de outra forma. Fui conduzido por duas pessoas altas, até uma espécie de elevador panorâmico, e fui subindo, subindo, vi a Terra toda azul e zapt-zupt, fui transportado de maneira imaterial para um imenso salão medieval. Os dois sujeitos altos do elevador me conduziram até um sofá e um deles fez um gesto com a mão que fez baixar, ou aparecer, uma tela de cinema.
Ouvi uma voz melodiosa feminina dizer - vai ficar tudo bem e logo depois uma voz cavernosa dizer - bandido bom é bandido morto.
A voz melodiosa feminina disse: não ligue para ele.
A voz cavernoso replicou: você é meu, rapaz .... e deu uma gargalhada pavorosa.
Corta para a tela. Gente, passou o filme da minha vida e eu sentia a mesmas coisas de quando ocorreram - medo, tristeza, alegria, raiva e nojo. Chorei muito.
De repente sumiu a tela e apareceu uma mesa, destas de fórum, imensa, alta, com três seres feitos de luz, imponentes, sentados em cadeiras belíssimas. Não identifiquei neles o cara da voz cavernosa nem a dona da voz melodiosa, até os ouvir falar e percebi que falavam apenas dentro da minha cabeça, que loucura. o cavernoso era ácido, mas com grande senso de humor, destes de Stand Up e a melodiosa era sempre terna, elegante e séria. A diferença era que o cavernoso queria me jogar num buraco negro e a melodiosa queria me levar para um jardim celestial.
O sujeito que devia ser o magistrado, perguntou olhando para mim: O que a senhora tem a dizer pela defesa do seu cliente?
Achei aquilo estranho, tratar-me como uma senhora era demais e além disto não emitiu nenhum som e mesmo assim ouvi, como se fosse uma telepatia. Só então percebi que se dirigiu à voz melodiosa que habita minha mente. A delicada voz feminina e melodiosa falou de dentro da minha cabeça - este homem é inocente, Senhor, e posso provar com provas materiais, testemunhais e espirituais.
Enquanto eu tentava entender, aqueles dois do elevador se aproximaram do magistrado e discutiram pelo pensamento. Foi uma conversa tensa pelas expressões faciais e movimentos das mãos. O magistrado, de pé, apontou para mim e disse - fora, volte agora de onde veio.
A voz cavernosa colapsou em gritos hediondos, fazendo-me contorcer como estivesse convulsionando Os dois seres gigantes enfiaram as mãos dentro da minha mente e puxaram uma coisa asquerosa, disforme e agitada feito um histérico gel fosco de maldades que habitava dentro de mim e a trancafiaram numa caixa.
A voz melodiosa feminina disse - não falei que ia ficar tudo bem? Confie mais em mim. Agora vamos para casa.
Acordei dentro do carro, com um senhor batendo no vidro e perguntando se estava tudo bem, pois ele precisava sair com o carro da garagem.
É isto aí!
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