Dalvinha tinha dezoito anos e residia com a irmã e o marido, médico novo, educado, que a apresentou ao amigo, o entediante Dr. Torres, o mais antigo dentista da região, viúvo, com os dois filhos e netos morando na capital. Foi assim que a moça se viu casada com o odontólogo e tornou-se vizinha do delegado.
Então, certa vez, ainda de madrugada bateram na janela da autoridade policial. A patrulha comunicou que o médico tinha morrido. Levantou ainda tonto pela noitada anterior, acordou com dificuldade, dispensou os soldados e foi fazer um café.
Então, certa vez, ainda de madrugada bateram na janela da autoridade policial. A patrulha comunicou que o médico tinha morrido. Levantou ainda tonto pela noitada anterior, acordou com dificuldade, dispensou os soldados e foi fazer um café.
Assim que abriu a porta dos fundos, para lavar
o rosto no tanque, observou um vulto e percebeu que era a Dalvinha, com uma
agilidade felina, pulando a cerca da divisa em direção à sua casa,
provavelmente antes que o marido desse pela falta.
Tomou banho sem pressa,
barbeou-se, procurou a melhor farda, e saiu a pé pela ladeira
orvalhada em tons dourados do sol nascente, que lhe validava o apelido de
Ladeira do Ouro.
Chegou à praça da Matriz, onde
estavam diversas personalidades importantes, entreolhando-se e se perguntando
como se deu uma morte tão rápida de homem jovem e pletórico?! Um conhecido das farras e carteado o puxou
pelo braço e delatou sobre a suspeita de que o falecido estava de caso com a
Dalvinha, e que talvez o dentista o tenha envenenado. Assim que falou e não viu
nenhuma expressão no rosto do delegado, engoliu em seco, pigarreou, tossiu,
sorriu sem graça, levou a mão na garganta e saiu em silêncio.
Passou na casa, cumprimentou e manifestou
seus pêsames à viúva, visivelmente triste e abalada. Foi na
farmácia comprar uma aspirina, mas o decano farmacêutico levou-o compulsoriamente até os fundos e desabafou com sua voz rouca e asmática - delegado, eu acho que estou
encrencado - estou tendo um caso com a Dalvinha usando o sobrado da loja para nossos encontros furtivos. Estou com medo, por que dizem que o médico
também estava se relacionando com ela e vai que estas informações se cruzam. Eu
sou inocente. Deu um abraço no velho amigo da família, encorajando-o - Para com
isto, esqueça a Dalvinha e pronto. Não vou permitir que nada te aconteça.
No velório, o Dr. Fagundes, um juiz aposentado com seus quase noventa anos de vida, acenou
para que aproximasse e pediu ajuda, pois vinha tendo uma relação intensa com
a Dalvinha e parece que o médico também ... Com um forte aperto de mão no idoso, disse que iria resolver aquilo da melhor forma e que esquecesse a Dalvinha,
pois existiam outras moças tão ou mais bonitas e disponíveis que ela, esperando
por alguém.
As cantorias, as velas, os
cochichos, as garrafas de café com biscoitos de polvilho, um bando de mulheres
na cozinha e grupos espalhados pela mansão. O dia foi lento e tenso, com
olhares, pudores, discursos e eventos lembrados com o morto. Um mês depois
recebeu o laudo da autopsia, feita na capital, dando conta de uma falência
súbita por uma cardiopatia grave, que era de conhecimento do falecido.
Portanto, nada de crime.
Guardou silêncio, chamou os envolvidos com a esposa do dentista, e em conversas reservadas aconselhou
ficarem longe dela, pois o laudo dava brecha para suposições. Tudo arranjado
nas formas da lei, amasiou com Dalvinha, a quem jurou
amor eterno e fidelidade.
É isto aí!
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