quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Moracuela

Adãozinho era um simpático e franzino alfaiate, da quarta geração dos alfaiates daquela pequena e pacata cidade do interior. Tinha 1:50 de altura, sempre sério e compenetrado nos seus afazeres do corte e da costura.

Começou a namorar Iaiá Cascalho, uma mocinha linda, 1:75 de altura, fora o salto de 15 cm que não tirava, beata da igreja, cantora do Coral, catequista, bordadeira, calada, e dona de um corpo divino e desejado por todos os homens da região.

O casamento deu-se em festa de três dias, com presença de deputados, vereadores, prefeitos, bispo, autoridades, ricos, pobres, comerciantes, comerciários, enfim, todos queriam ver aquela união entre a mais linda e o mais discreto homem da região.

Passados três meses Adãozinho procurou pelo padre e falou que queria o divórcio, no que foi duramente criticado. Procurou o juiz, o delegado, o escrivão do cartório e todos o recriminaram por aquela conduta. Imagina, uma moça feito a Iaiá, uma flor rara nos campos da beleza. Mas não conseguiram demovê-lo. Teve que viajar à capital para contratar um advogado para cuidar de tudo, pois os dois da cidade se recusaram - imagina, Adãozinho, um mulherão feito a Iaiá não se larga assim, diziam. Mudou para a alfaiataria e deixou a esposa, sozinha, na casa simples que construíra com sacrifício.

No dia da audiência de conciliação, o juiz, para intimidar o rapaz, chamou toda a sociedade e clero para estarem presentes. Aquilo ficou mais para julgamento do que uma simples audiência. Cada um dos convidados teve quinze minutos para falar das virtudes do casamento, da beleza da moça, das descobertas de um no outro no decorrer da vida conjugal e sobretudo, nos valores da família.

Adãozinho ouviu tudo com a cabeça baixa, olhos cegos de ódio e mãos suando ininterruptamente. Seis horas de falas diversas, Iaiá é chamada a fazer seu depoimento - chora, faz beicinho, gestos teatrais, caras e bocas e finalmente disse que não entendia nada do que estava acontecendo, e que tudo que queria era ser feliz.

O juiz pede para a moça sentar-se e chama Adãozinho. Levanta, de cabeça abaixada, chega à mesa e em pé, com a mão direita espalmada, com os quatro dedos em riste, bate na beirada do tampo da mesa simultaneamente à sua fala, na realidade um grito repetido em três atos:

Senhor Juiz - MORACUELA (bate na mesa pesadamente com os quatro dedos), MORACUELA (bate na mesa pesadamente com os quatro dedos ), MORACUELA (bate na mesa pesadamente com os quatro dedos).

O juiz olhou para Iaiá, que olhou enigmaticamente para ele. Silêncio total no salão. Adãozinho saiu dali divorciado.  

 É isto aí!


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