segunda-feira, 3 de agosto de 2015

O Profeta apaixonado

FELIZIN, ROSTISLAV IVANOVICH (1830 Russia 1904)
O profeta mandou reunir toda a congregação no plenário do templo. Já estava velho, mas ainda comandava com mão de ferro todas as ações da comunidade. Uma chamada daquela, às cinco horas de uma manhã gelada tinha que ter algo diferente. Os dois sinos de bronze não pararam de soar até que todos estivessem presentes. Uns assustados, outros com medo, as mulheres aflitas e os homens ansiosos. 

Eram cinco e dezessete, e eis que tranquilamente adentra no templo. Era um velho de origem desconhecida, sotaque ininteligível, humor destemperado e um apetite sexual inesgotável, segundo informações sigilosas das suas duas esposas da terceira geração. As duas esposas da primeira geração eram irmãs gêmeas, e faleceram há uns dez anos. As duas esposas da segunda geração tinham idades em torno de 40 anos, e as da terceira geração entre 30 e 32 anos.

Ele tinha longa barba branca e cabelos presos por uma tiara de brilhantes. Trajava uma túnica roxa de fios de lã do extremo-oriente com mangas largas, sapatos de couro amarelo flexíveis e moldados anatomicamente, amarrados no tornozelo com tiras de lã dourada. Entrou em silêncio, vindo pelo adro central e percorreu todo o caminho sobre pétalas de flor jogadas num carpete lilás Estava apoiado em seu cajado, sendo acompanhado por suas esposas e os primogênitos masculinos de cada uma delas. 

Meus filhos - bradou, meus filhos, chegou a hora de despedir de todos vocês. Minha peregrinação chega ao fim nesta manhã. Deixo para vocês a sabedoria e a riqueza, a esperança e a fartura, a amizade e o amor, enfim, vocês não precisam se preocupar com mais nada. (Choros, lágrimas, gritos histéricos, lamentações, etc.)

Como sucessor, nomeio incondicionalmente o Geraldinho da Adelaide. (Vaias, gritos, vaias, assobios, vaias, achincalhes, enfim, tumulto geral).

No meio da convulsão, Geraldinho abaixa a cabeça, esconde-se e sai pela porta lateral sem ser notado, dá a volta, intercepta o Profeta.

- Mestre, por que eu?
- E porque não você, Geraldinho?
- Mas o senhor nunca falou que seria eu.
- Mas também nunca disse que seria outra pessoa.
- Mas se eu recusar?
- Adeus, Geraldinho, volte e assuma sua posição perante a assembléia.

Geraldinho voltou, dirigiu-se ao altar, as esposas da terceira geração do profeta o adornaram e se prostraram aos seus pés. O povo se redimiu e curvou-se em silêncio. Ele correu os olhos e buscou por Adelaide, a moça mais linda de todos os tempos da comunidade, uma diva da beleza e da graça humana. Ela não estava, mas ele não teve tempo para perceber o que acontecera.

O profeta fugira apenas com uma pequena quantidade de ouro e junto carregou Adelaide, o primeiro grande amor da sua vida, para um local distante, muito distante e foram felizes para sempre...

É isto aí!

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