Na nossa sociedade é normal que um Prêmio Nobel da Paz
desencadeie uma espiral de atritos que pode levar até uma guerra. É exatamente isso que o
simpático Obama faz. Tanto para sermos claros: uma guerra, e mundial, existe já.
Só que é combatida em âmbito econômico e financeiro, não há balas que voam, não
há granadas lançadas. Há mortos, sem dúvida, mas não fazem efeitos, por isso
podemos continuar a viver alegremente, como se nada acontecesse.
Aqui falamos duma guerra verdadeira, a guerra
"clássica". Será este o futuro próximo? Provavelmente não, pelo menos não de forma imediata. Mas o
que Obama faz é elevar a fasquia de risco e alimentar aquelas condições que,
mais cedo ou mais tarde, irão levar até uma guerra. Simples prever os dois lados: Rússia e China, EUA e
aliados.
Pouco importa que os discurso neoconservadores e hipócritas
que profere sejam escritos pelo mesmo Obama ou por quem realmente dirige a
política em Washington. A Primeira e a Segunda Guerra Mundial foram o produto
das ambições e dos erros de um pequeno número de pessoas: a História repete-se, sempre.
Em "A Gênese da Guerra Mundial", Harry Elmer
Barnes demonstra que a Primeira Guerra Mundial foi causada por 4/5 pessoas. Não
mais. Três delas destacam-se: Raymond Poincare, Presidente da França, Sergei
Sazonov, o ministro das Relações Exteriores russo e Alexander Izvolski,
embaixador russo na França.
Poincaré queria a Alsácia-Lorena da Alemanha, os russos
queriam Istambul e o Bósforo, que liga o Mar Negro ao Mediterrâneo. Perceberam
que as ambições necessitavam duma guerra geral europeia e trabalharam para
produzir apenas esta guerra. Depois a coisa descarrilou e o culpado foi
individuado no Kaiser alemão Wilhelm II, paradoxalmente a pessoa que tudo fez
para evitar o conflito.
Da Segunda Guerra nem vamos falar aqui: o assunto é muito
polêmico e conduziria bem longe. O que importa é que hoje estamos de volta num caminho que
pode levar até uma guerra mundial ou que, pelo menos, reforça as condições para
futuros atritos de alto nível.
Cem anos atrás as bases para lançar uma guerra mundial foram
basicamente uma: o dolo. As pessoas dos Países envolvidos foram submetidas a
lavagem cerebral e propaganda agressiva (na Inglaterra eram distribuídos
panfletos nos quais afirmava-se que os Alemães comiam as crianças da Bélgica).
Hoje em dia é mais do que óbvio quem está a trabalhar para a
guerra. As mentiras são óbvias e todo o Ocidente está a participar nisso com os
governos e os meios de comunicação.
O fantoche americano, o primeiro-ministro canadense Stephen
Harper, mentiu para a televisão quando disse que o presidente russo Putin
invadiu a Crimeia, ameaçou a Ucrânia e deu início a uma nova Guerra Fria. O
apresentador do programa, aí sentado, acenou com a cabeça em concordância com
essas claras mentiras claras: é o trabalho dele, o bom jornalista moderno,
espalhar e amplificar as mentiras do regime.
O roteiro que Washington forneceu ao fantoche canadense é o
mesmo que foi entregue a todos os bonecos nas outras partes do Ocidente, a
mensagem é a mesma: Putin invadiu e anexou a Crimeia, Putin está determinado a
reconstruir o Império Soviético, Putin deve ser interrompido.
Nos Estados Unidos é ainda pior. No passado 26 de Março, a
Fox (o órgão de propaganda do bilionário Murdoch) relatava que Putin efetivamente
restaurou a prática soviética do exercício da força bruta, coisa que a Fox,
naturalmente, considera como um gesto perigoso e ameaçador para o Ocidente. E
não podia ter faltado o expert, tal Eric Steckelbeck, segundo o qual Putin
encarna uma espécie de "jovem Hitler".
A mentira descarada pela qual a Rússia enviou o exército e
anexou a Crimeia é agora um fato adquirido em todo o Ocidente. Obama, cuja
administração derrubou um governo democraticamente eleito (pormenor
regularmente esquecido) da Ucrânia para substitui-lo com um fantoche que
ninguém alguma vez elegeu, agora acusa Putin de "invasão e anexação"
da Crimeia.
A ignorância histórica total do Ocidente, juntamente com a
facilidade com a qual as notícias são manipuladas, cria monstros: Obama disse
recentemente que a "Ocupação da Crimeia" por parte de Putin é mais
grave do que a guerra dos EUA no Iraque. Washington causou a morte de um milhão
de pessoas (no mínimo), o deslocamento de quatro milhões de pessoas, a
destruição das infra-estruturas, a explosão de violência religiosa no Iraque: e
isso é vendido como sendo mais grave do que uma "ocupação" que nunca
aconteceu.
O discurso de Obama em 26 de Março, no Palácio das Belas
Artes de Bruxelas, é nada menos do que surreal. Vai muito além da mera
hipocrisia. Obama diz que a autodeterminação da Crimeia desafia os ideais do
Ocidente, a Rússia deve ser punida pelo Ocidente por ter permitido que a
Crimeia escolhesse o seu próprio destino. O regresso (de livre vontade) duma
província russa à terra natal é considerado por Obama como uma ação ditatorial
e anti- democrático. Mas de quais valores fala Obama?
Obama, cuja administração acabou de derrubar um governo
democraticamente eleito da Ucrânia e substituí-lo por servos, fala do
"ideal sagrado pelo qual os povos de todas as nações são livres de tomar
as suas próprias decisões sobre o seu próprio futuro". Falta o quê? Falta
o asterisco: *exceto a Crimeia.
Obama fala de "direitos individuais e do Estado de
direito". Qual Estado de Direito? Certamente não em Kiev, onde um governo
eleito foi derrubado com a força e substituído por pessoas que nunca foram
eleita por ninguém. Queremos falar da tortura? De Guantánamo? Onde ficam os
direitos em tudo isso? Como é possível que o representante do governo dos
Estados Unidos possa arrogar-se o direito de falar perante público europeu de
"Estado de direito", "direitos individuais", "dignidade
humana", "auto- determinação", "liberdade"? Iraque,
Afeganistão: diz nada isso? As revoluções coloridas do Egito, da Líbia? A
Síria?
Não é Washington que se arroga o direito de atacar com
drones civis americanos em qualquer parte do globo? E quando os drones atingem
inocentes, crianças? O que acontece? Nada, pois neste caso os direitos passam
ao lado.
Ninguém tem aplaudido o sermão de Obama. O que não admira:
há limites, pelo menos de bom gosto, e Obama ultrapassou-os. Mas o que importa
é que a Europa vai aceitar a versão oficial de Washington, tal como o programa
de escalada até a guerra.
Obama pede mais tropas da Otan estacionadas na Europa
Oriental, para "conter a Rússia".
Obama disse que um acumulo de forças militares nas
fronteiras da Rússia tranquilizaria a Polônia e os Estados Bálticos que, como
membros da Otan, estariam protegidos de uma possível agressão da Rússia. Mas
porque: alguém na Polônia ou nos Países Bálticos imagina uma invasão russa?
Obama não diz qual será o efeito que isso terá sobre a
Rússia: e não é preciso, pois sabe já o que irá acontecer. A escalada militar
EUA-Nato e outros jogos de guerra na fronteira russa irão desencadear uma
reação: mais armas, mais meios militares. Um regresso à Guerra Fria.
A"liberdade não é livre" afirma Obama. Assim,
apesar de violar as leis internacionais, com a tortura, a invasão de Países
soberanos sob falsos pretextos e o repetido derrube de governos eleitos
democraticamente (mas que não seguem a linha de Washington) os Estados Unidos
continuam a ser "o grande e excepcional País que traz a liberdade e
democracia no mundo". E os média repetem o mantra: a aceitação pela Rússia
da autodeterminação da Crimeia é uma violação da lei internacional.
Pergunta: mas existirá um a lei internacional que Washington
e os seus Estados fantoches até agora ainda não violaram? Diz Obama: "Os
países maiores simplesmente não podem comportar-se como um valentão perante os
Países menores". Resposta: Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia, Paquistão,
Iêmen, Somália, Líbano, Irão, Honduras, Equador, Bolívia, Venezuela, Cuba. E
porque não falar da CIA e das manobras em toda a América Latina?
Mas realmente alguém acredita que a Obama interesse o
destino dos cidadão Ucranianos? Obama, que deixa que as próprias forças armadas
matem pessoas todos os dias em vários pontos do planeta? Obama transformou o
governo ucraniano com o único fim de anexar o País à Nato, afastar a Rússia das
bases navais no Mar Negro e plantar mísseis americanos na fronteira russa.
Este não é "anti-americanismo": é ser contrário a
um pequeno grupo de pessoas que fazem da violência, verbal ou factual, o
próprio lema político. É ser contrário a uma sociedade na qual é negada a
possibilidade de conhecer os factos sem que estes sejam antes filtrados pelos
media de regime. É ser contrário a um jogo no qual todos somos peões, a começar
pelos cidadãos do EUA.
Agora o pequeno grupo obtém o apoio dos governos fantoches,
sem que estes entendam (ou queriam entender) que o objectivo é a preparação do
campo de batalha. E as pessoas comuns, desinteressadas, mal informadas, ficam
cegas. Mais uma vez, vemos o mundo arrastado ao longo dum perigoso trilho
através da floresta de mentiras e propaganda.
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